O mais recente artigo de revisão do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR) abre horizontes para a identificação de espécies de abelhas numa diversidade de ecossistemas, e teve como base o bioma da Caatinga no Brasil.
Os polinizadores, especialmente as abelhas, são cruciais para manutenção dos ecossistemas, mas, além disso, têm um papel fundamental na reprodução das plantas. Numa altura em que as necessidades alimentares do ser humano dependem grandemente da polinização, as abelhas e outros polinizadores têm sofrido com ameaças como a poluição, o uso de pesticidas, a agricultura intensiva e de monoculturas, a falta de água, desmatamento e as alterações climáticas. Estudar a sua diversidade é por isso essencial, para podermos conservar estes “pequenos trabalhadores”.
Segundo a Organização para a Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO), mais de 75% da produção mundial de frutos e sementes para consumo humano depende da polinização. É neste sentido que os estudos focados em novas metodologias de identificação, distribuição, ecologia e conservação destes animais são mais importantes do que nunca.
Um recente artigo de revisão, “
Barcoding the Caatinga biome bees: a practical review” publicado na revista científica
Molecular Biology Reports” , apresenta avanços significativos nessa área. Conduzido por investigadores do grupo
Ecosystem Monitoring and Sustainability do CIIMAR -
Pedro Rodrigues,
Cláudia Teixeira,
Laura Guimarães e
Nuno Ferreira - o estudo desenvolveu e aprimorou ferramentas para identificação de espécies de abelhas, agora disponíveis globalmente.
O objeto de estudo deste trabalho foi o bioma da Caatinga, um bioma altamente especializado e exclusivo do Brasil que ocupa uma área de 826.411km
2 e apresenta uma flora e fauna rica em endemismos. Ao complementar a identificação morfológica tradicional com técnicas de biologia molecular e barcoding, que usam o “código de barras de ADN” destas espécies para as identificar, o estudo permitiu ampliar o conhecimento das espécies de abelhas neste habitat.
Este estudo permitiu a identificação de mais 75 espécies e 9 géneros em relação à última descrição para este bioma, apresentando um avanço significativo. No entanto a equipa alerta que estes resultados podem ainda não refletir “a total biodiversidade que pode ser encontrada” e evidencia que há necessidade de novos esforços que nos permitam catalogar a riqueza existente.
Mais 75 espécies identificadas
Não é a primeira vez que se faz a identificação das espécies de abelhas no bioma da Catinga. A última vez foi há 25 anos e utilizando apenas métodos tradicionais. O estudo apresenta agora uma clara vantagem em relação aos estudos anteriores publicados na mesma temática, sendo uma revisão mais abrangente, e muito mais completa. Podendo agora ser usada para a preservação e conservação de espécies do bioma singular e único da Caatinga.
O potencial da biologia molecular na conservação
A utilização destas técnicas de barcoding podem ser ferramentas poderosas na conservação do bioma da Caatinga, permitindo fazer uma identificação de espécies presentes, estejam elas descritas ou não. Depois de ter permitido ampliar o conhecimento sobre as espécies deste local, os recursos gerados no âmbito deste trabalho podem também servir de base para as investigações que lá se realizam. Segundo Cláudia Teixeira, autora deste estudo, “além de trazer novidade sobre o estado atual dos ecossistemas, a ferramenta é facilmente reproduzida, fornecendo a qualquer investigador uma base sólida em futuras investigações para compreender a biodiversidade local.”
Segundo a investigadora, o impacto deste conhecimento é, porém, muito mais alargado: “a identificação de espécies e monitorização pode também ser bastante útil para entender tendências de declínio, ou aumento das populações de abelhas” sobretudo no contexto de um clima em mudança. E acrescenta: “ao identificar e catalogar espécies de insetos polinizadores, como as abelhas, que têm papéis tão fulcrais na polinização, este trabalho visa também ressaltar a importância destas espécies para os ecossistemas, e os serviços dos ecossistemas que beneficiam a sociedade, como a produção de alimentos, manutenção e diversidade de vegetação, com impactos diretos na economia.” Assim, este trabalho contribui não só para a conservação, mas também para uma consciencialização sobre o papel dos polinizadores.
O bioma da Caatinga
A Caatinga é um bioma, ou seja, uma grande comunidade ecológica com características singulares que se expande por uma grande área. É exclusivo do Brasil e caracteriza-se por uma fauna e flora únicas adaptadas às condições extremas, que variam entre períodos de seca extrema e períodos de precipitação intensa. Apresenta um clima semiárido, vegetação com pouca folhas e adaptadas a períodos de seca cujas condições de crescimento se fazem equiparar aos desafios que as alterações climáticas têm trazidos a outras zonas do mundo. Apesar da importância ecológica e biodiversidade deste bioma, muitas das espécies que habitam este bioma não são conhecidas assim como as suas características e funções.
Ends.